| tudo que nunca te disse |

um mistério domina as questões pontiagudas que lhe saem da boca. quer destruir laços, mas não consegue, quer deitar abaixo as fundações da verdade, mas sente-se incapaz. é perfeitamente normal, não tem qualquer característica incomum, mas sente-se na necessidade de profetizar a sua vontade. milagres não acontecem, por isso tem que se apressar, o tempo não espera, não faz paragens, não aguarda pacientemente como se de tempo ele próprio precisasse. o espelho dita as revelações mais mórbidas do passado que continua presente em cicatrizes imortais. os olhos reagem com estranheza às observações estupefactas, às imperfeições putrefactas, às explicações abstractas. os ouvidos esvaem-se em sangue invisível com palavras que, como espadas de aço, ferem qualquer sentido. são demónios que presidem ao inferno da vida. são pequenos insectos que devoram insaciavelmente os restos de alegria que se prendem à esperança que enfraquece. o mistério não se resolve, nunca se resolverá sem a verdade. mas a verdade, crua e dura, nunca sairá sem ferro e fogo. nunca sairá por sua própria iniciativa nem será imprudente a mostrar a sua existência. que comece o jogo, que comece a roleta. que se disparem as balas, que se matem os inocentes. que se percam os vivos, que se culpem os mortos. mas, acima de tudo, que se revele a verdade. a verdade é o centro deste universo, desta galáxia, deste mundo que gira em torno da rude mentira. o carrossel já nem é redondo, sentiu-se ridicularizado por ter uma forma tão pura. mesmo as edificações circulares se sentiram embaraçadas por serem circulares. assemelham-se ao mundo, e sendo o mundo um antro de mentira, precisaram de se cobrir infinitamente. o mistério é uma tortura que continua os seus passos lentos até ao precipício da morte. um dia alguém cai, revela a verdade, e desaparece. no outro, tudo volta ao normal. cai, por favor. continuo à espera da verdade que me faça mais forte que ontem e mais fraco que amanhã.